Com influências de rock progressivo, pós-punk e jazz experimental, o novo trabalho traz colaborações de Bianca Gonzales, Galf AC, Dubzoro e Alfão
A Colibri está de volta com “3R [pt. II]“, segundo capítulo da trilogia que a banda baiana começou a construir em 2020, quando os integrantes se isolaram durante a pandemia em Cachoeira do Itanhy, no interior da Bahia. O que era pra ser um refúgio se transformou em um verdadeiro laboratório criativo, onde a banda passou a reinventar sua identidade musical e refletir sobre transformações pessoais e coletivas em meio ao caos global.
Nova formação, sonoridade densa e faixas mais reflexivas
Com a saída de Levi Vieira (guitarra) e Victor Vogel (bateria), a Colibri abre espaço para uma nova formação: Paulo Tiano assume a bateria e Paulo Pitta chega com o saxofone. A mudança traz um fôlego diferente para o grupo, que já flertava com o rock progressivo, pós-punk e jazz experimental, mas agora aprofunda ainda mais essas misturas, adicionando influências de folk, dream-pop e música eletrônica.
O clima do álbum é mais denso, mais catártico, e isso não é por acaso. A banda quis traduzir em som o impacto da instabilidade do nosso tempo. “A arte pode cristalizar sentimentos e ajudar a processar esse período louco com novos e mais leves ares”, comenta José Neto, vocalista e principal compositor da banda. As faixas exploram temas como a passagem do tempo, o consumo desenfreado e a urgência por conexões autênticas em meio a uma realidade cada vez mais líquida e acelerada.

Participações que expandem o som
O disco traz colaborações que enriquecem ainda mais a experiência sonora. Na faixa “The Roadhouse, pt. II”, os rappers Galf AC, Dubzoro e Alfão criam um diálogo potente entre o rap e o rock. Já em “Boca que Quis”, a participação de Bianca Gonzales (Noite Suíte) adiciona leveza e poesia com sua voz etérea. Em “Cuban Coffee”, o sax de Paulo Pitta conduz a faixa com tensão e melancolia, ecoando sensações de alienação moderna.
Processo independente e estética própria
Gravado ao longo de oito meses, entre 2023 e 2024, “3R [pt. II]“ tomou forma em sessões semanais realizadas nos estúdios Cremenow e Mangus. O disco chega ao público de forma independente, com distribuição via OneRPM. O visual do projeto continua nas mãos do tecladista Rodrigo Santos, que assina as capas com paisagens abstratas e texturas que evocam o passar do tempo, tudo pensado para criar uma experiência sensorial completa.
Novos palcos para a reta final da trilogia
Com o lançamento do álbum, a Colibri dá início à nova fase de shows. As apresentações começam no segundo trimestre de 2025, passando por cidades como Salvador, Aracaju, Feira de Santana e Alagoinhas. Além da turnê, a banda também prepara um documentário e uma live especial para marcar esse momento.
Enquanto apresenta “3R [pt. II]“, a Colibri já finaliza o terceiro e último capítulo da trilogia, previsto para chegar ainda em 2025. Paralelamente, a banda se mostra aberta a convites e contratações, pronta para levar a energia do novo disco a diferentes cidades e públicos.
FAIXA A FAIXA – 3R [PT. II]
The Roadhouse [Pt. II]
Nos transporta para o sacerdócio da crítica lírica no rap, explorando a conexão sinestésica entre o rap e o rock. Parte do universo da faixa-tema que costura os capítulos da trilogia 3R, a música conta com a participação dos rappers soteropolitanos Galf AC, Dubzoro e Alfão. Seu arranjo evoca trilhas sonoras de filmes e séries de terror modernas, criando uma atmosfera vibrante que captura a energia ao vivo da banda. Guitarras, baixo, bateria, sax e sintetizadores compõem um cenário sonoro intenso, onde se destacam a reflexão existencial cósmica de Galf, a malandragem filosófica de Alfão e a poesia explosiva de Dubzoro. Os versos abordam ciclos, vícios, a passagem do tempo e a dúvida sobre a existência de vida no espaço, enquanto o instrumental amplia a fusão entre rap e rock de forma orgânica e inovadora.
Soteropolis Nocturna (Interlúdio)
Um interlúdio instrumental que pinta a paisagem noturna da cidade de Salvador, Bahia. A faixa combina camadas de sintetizadores envolventes, violões sobrepostos e um riff de guitarra hipnótico. O solo de saxofone conduz o ouvinte ao amanhecer, representando a beleza inspiradora da cidade quando a luz invade sua superfície tropical em tons arroxeados.
Boca que Quis
Parceria entre Colibri e Noite Suíte, essa faixa espectral e emocionante traz uma letra poética e apaixonada. José Neto descreve uma febre romântica, em que uma paixão perdida retorna em busca de reconexão, revivendo o prazer dos lábios do eu lírico. No entanto, a realidade invade o delírio, mostrando que reviver esse amor seria como dar pólvora ao fogo. Com uma sonoridade intensa, psicodélica e sentimental, a música resgata a nostalgia das borboletas no estômago e carrega um otimismo pulsante, contrastando sonho e realidade.
Cuban Coffee
Uma reflexão sobre a ansiedade e alienação da vida contemporânea, expressa através de uma melodia e batida marcantes. A letra de José Neto questiona as prioridades de uma sociedade que privilegia o artificial em detrimento do orgânico. Sem soar acusatória, a canção sugere um embate entre apatia e o desejo por autenticidade. O solo de saxofone de Paulo Pitta traduz essas tensões, dialogando livremente com o arranjo e reforçando a sensação de inquietação. A produção de Tiago Simões organiza mais de 100 tracks, misturando rock, jazz e influências afro-diaspóricas da música baiana. A percussão de Cassiano Alexandrino evoca conexões ancestrais e espirituais, criando um contraste entre a desconexão moderna na busca por algo mais primal e autêntico. O resultado é uma faixa hipnótica e instigante.
Rosto Sem Nome
Uma canção intimista e mântrica sobre saudade e a passagem do tempo, introduzindo a segunda parte da trilogia 3R. José Neto se despe de ironias e se entrega completamente à emoção, acompanhado por dois violões que desenham um horizonte sonoro. A guitarra de Levi Vieira amarra o solo de violão em um abraço fraterno. A letra aborda temas como a iminência de mísseis nucleares, amores que ficaram para trás, o medo do fim do mundo e a nostalgia da infância. Apesar das perdas da vida adulta, a música surge como um refúgio e um alívio, deixando no ar a esperança de resistir às provações do mundo.
Out of Grrrasp
Uma viagem nostálgica aos anos 80, Out of Grrrasp conta com a participação especial de Hiran, um dos destaques do rap queer nacional. A música combina elementos do rock alternativo, disco e pós-punk para criar uma experiência sonora envolvente.
Criada durante o isolamento social de 2020, a canção reflete sensações e emoções universais, especialmente aquelas intensificadas pela pandemia, quando o distanciamento ampliou o anseio por conexões humanas e encontros reais. Com uma batida de pista contagiante, riffs de guitarra enérgicos e uma atmosfera dançante, “Out of Grrrasp” transporta os ouvintes para o ambiente de uma boate, evocando mistério e intriga enquanto reforça a busca por presença e pertencimento.