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“O Pequeno Corpo” mescla contrastes de forma magestral

Em um dia comum de 2016, Laura Samani se depara com um pequeno santuário Trava. Nele, ela descobre um fato curioso: até o século XIX, havia uma crença de que o solo daquele local era sagrado, o que o possibilitaria trazer à vida bebês natimortos. No entanto, a condição seria temporária: eles dariam apenas um suspiro, para poderem ser batizados e então enterrados.

A história inspirou Laura a escrever e dirigir, anos mais tarde, o longa “O Pequeno Corpo“, que chega aos cinemas brasileiros em 16 de novembro, com distribuição da Pandora Filmes. E não foi só isso, o filme também rendeu à Samani o prêmio David di Donatello (mais importante prêmio cinematográfico italiano) de Melhor Cineasta Estreante.

O Pequeno Corpo” conta a história de Agata (Celeste Cescutti), uma mulher que acabou de dar à luz um bebê natimorto. Ela parte rumo ao Norte, em busca de um santuário milagroso que ressuscite sua filha e a batize, para que a alma da criança saia do “Limbo” e chegue ao céu. Ela encontra o jovem Lynx (Ondina Quadri) pelo caminho, que acaba ajudando-a nessa missão.

Apesar do longa se passar nos anos de 1900, começando em um vilarejo pouco povoado e rústico, ele consegue introduzir com muita naturalidade temas contemporâneos como a existência de pessoas queer e de gênero fluído, além da emancipação feminina. Mas tudo isso sem alardes, e sem que estes sejam os principais (ou únicos) pontos da personalidade do personagem em questão.

O processo criativo de “O Pequeno Corpo”

Em algumas entrevistas, a diretora do longa comenta que gravou a maior parte das cenas em sua terra natal, Friul-Veneza, e que enquanto procurava por lugares para filmar, acabou incluindo diversos moradores e moradoras da região no longa, fazendo com que a maior parte do elenco fosse composta por pessoas que nunca atuaram antes.

Isto influenciou diretamente na escolha do idioma da película, fazendo com que a diretora optasse por usar os dialetos da região, Veneto e Friuli, “para que as pessoas pudessem se expressar da maneira mais natural possível” e também para que o público pudesse “conhecer a língua autêntica da época“, conforme ela comenta.

Durante o processo de pesquisa e construção do roteiro, Laura descobriu que a maioria das pessoas que levavam seus bebês à Trava eram homens. Isso fez com que ela se questionasse e começasse a pensar no que aconteceria se uma mulher fizesse o trajeto:

“Para mim, a melhor parte de uma história é aquele momento em que um personagem decide se rebelar. A escolha de Agata é praticamente escandalosa porque denota orgulho e protesto não apenas contra sua religião, mas também contra as leis da natureza. Agata decide ouvir as vozes que falam sobre os milagres. Seguindo seu instinto e sem contar a ninguém, ela parte em uma viagem com seu bebê em uma pequena caixa. Sozinha”, explica a diretora.

A Fé

Fé é um tema recorrente e bem forte na trama. À começar pelo nome da personagem principal, Agata, que parece fazer uma menção direta à Santa Agata, uma das mártires italianas mais populares da fé católica. Isso fica claro quando uma personagem comenta que Agata não tem esse nome à toa. A santa passa por uma série de martírios em vida, e a personagem de “O Pequeno Corpo” também. Talvez, mais do que nome, o elo forte que as une seja o dom de manter suas convicções intactas, mesmo que isso lhes custe um preço muito alto.

Agata é a personificação da fé. De uma fé em si mesma e em seus ideais, de uma fé religiosa, e até mesmo de uma fé nas pessoas. A personagem parece seguir um tipo de fé cristã, apesar de alguns rituais a que é submetida parecerem algo mais cultural do que religioso. Quando ela perde seu bebê, todos ao seu redor dizem que ela vai se acostumar.

É tudo muito duro e traumático; o padre da região piora as coisas dizendo que a alma de sua filha está em um limbo espiritual, e que elas só poderão se reencontrar um dia nos sonhos de Agata. Mas isso não é o suficiente para a personagem, que depois da sugestão de um conhecido, decide partir à procura do tal santuário capaz de fazer sua filha respirar uma vez, para que a alma dela possa descansar no céu.

Mesmo nunca tendo saído de sua pequena vila à beira-mar, Agata começa uma jornada rumo ao desconhecido, na fé de que tudo dará certo. A narrativa do longa se baseia em uma espécie de realismo fantástico, mesclando o real ao ilusório, o ultrapassado ao contemporâneo, o amor ao luto, e inserindo diversas contraposições que inacreditavelmente acabam funcionando muito bem.

Foto: Divulgação

Paisagens & Amizades

A cinegrafia do longa é simples, sem firulas, permitindo que a beleza natural do nordeste da Itália, por si só, surpreenda o espectador. As vestimentas, em tons majoritariamente bege, branco, verde, e azul, tanto pastéis quanto escuros, provocam um contraste interessante com o plano de fundo da maioria das cenas, que também reproduz e foca principalmente nessas cores. Essa combinação traz um toque de magia ao cotidiano, complementando bem o conceito do longa.

Apesar de locações muito bonitas, algumas escolhas da filmagem não exploram todo o potencial que o ambiente proporciona. Em várias cenas de caminhada e até uma em cima de uma carroça, a câmera está também em movimento, o que dificulta a visualização da cena, já que ela treme demais. A intenção pode ter sido de imergir o espectador com maior intensidade nas cenas, mas é exatamente o contrário que acontece, já que as cenas acabam chamando mais atenção por toda sua oscilação do que pela narrativa ali sendo desenvolvida.

A amizade que nasce entre Agata e Lynx é muito bem explorada. É como se eles fossem duas almas perdidas que se encontram. Agata mostra humanidade a Lynx, que por sua vez (depois de alguns tropeços) valida a dor e os sentimentos de Agata. Algo inédito para a personagem até então.

A igreja que Agata procura é justamente na cidade de origem de Lynx, o que traz muitos segredos à tona. O filme dá a entender que eles passam alguns meses por lá, já que chegam no que parece ser o outono e saem no inverno.

Foto: Divulgação

Alerta de Spoiler – O final

Durante todo o filme fica claro que Agata só encontrará paz quando resgatar sua filha do limbo.

O final traz uma cena muito bonita e poética, em que a personagem faz uma passagem simbólica da vida à morte enquanto mergulha em um rio. A iluminação da cena, bem como o contraste de suas roupas com a escuridão ao seu redor e uma claridade que vem do alto, fazem alusão à ideia que o filme abordou durante toda a sua narrativa. Parece que Agata “mergulhou” no limbo. E, quando finalmente encontra Mar (nome dado à sua filha), as duas conseguem submergir à superfície, que seria o “céu” no longa.

Foto: Divulgação

Fim dos spoilers

Apesar de ser o primeiro filme de Laura, “O Pequeno Corpo” é uma obra madura. Ele começa explorando um luto pessoal que aos poucos dá espaço a algo maior, mítico, surpreendente. Suas emoções são diretas e assertivas, mas ainda assim com um aspecto misterioso, que mantém o interesse do espectador até o fim.

E se você gosta de filmes italianos, não perca nossa cobertura do Festival de Cinema Italiano, que estará disponível gratuitamente até dia 09/12. Recentemente, analisamos 5 longas do festival: “A Sombra de Caravaggio“, “Ainda Temos O Amanhã“, “Obrigado, Rapazes“, “A Última Noite de Amore” e “A Última Vez Que Fomos Crianças“.

“O Pequeno Corpo”

(Itália/França/Eslovênia, 2021, 89 min.). Direção: Laura Samani. Drama. Em exibição nos cinemas de todo o Brasil à partir da próxima quinta-feira (16/11).

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