O mais novo drama do diretor Matthew Saville, “A Matriarca“, conta a história de um adolescente recém-expulso de um internato e a convivência forçada com sua avó, uma ex-correspondente de guerra. Apesar do início conturbado e da pouca intimidade, já que ambos mal se conheciam até então, o relacionamento entre eles vai florescendo e prendendo o espectador à cada nova cena.
A Capy conferiu o longa com exclusividade, antes do lançamento, e te conta o que esperar dele e o principal: por quê vale a ida ao cinema.
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Dores compartilhadas formam um elo
O filme começa de uma forma muito intensa mas com requintes de naturalidade. Desde um primeiro momento, percebe-se certas tensões familiares que cercam o dia-a-dia dos protagonistas. Isso fica evidente por detalhes de seu cotidiano que aparecem na tela, ou por coisas que os próprios personagens mencionam a respeito de si mesmos.
Conforme a narrativa avança, fica cada vez mais claro que, apesar de suas diferenças de personalidade, as dores que carregam dentro de si são parecidas. Esse fator mais intrínseco da experiência humana acaba funcionando no roteiro como elo condutor, que une os personagens e desenvolve o enredo. Assim, torna-se interessante acompanhar as mudanças nos relacionamentos dos protagonistas, bem como a forma gradual com que elas ocorrem. O longa parece, o tempo todo, preocupado em respeitar a verdadeira natureza deles. Por mais que alguém mude de ideia ou opinião sobre algo, isso acontece aos poucos, de forma nada apressada. Algo em uma velocidade realista e compatível com o que esperaríamos que acontecesse na vida real.
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A autorreflexão como instrumento narrativo
Ainda que o foco principal de “A Matriarca” sejam as relações familiares, é impossível não notar temas de autorreflexão também. A forma individual de se lidar com o luto, a percepção humana sobre a finitude de sua existência, o conceito de arrependimento, e até mesmo a depressão, são alguns dos temas abordados. O filme parece estar, o tempo todo, instigando o espectador a não apenas observar, mas também a interagir com os temas discutidos, a refletir sobre o que ele mesmo faria naquela situação, e a entender como se sente acerca das temáticas propostas.
É impossível não se identificar com algo no longa: seja alguma das dores ou conflitos enfrentados pelos personagens, ou alguma das situações que se apresentam diante deles. Talvez, inclusive, este seja um dos seus pontos altos: a tentativa honesta de conexão com o público.

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O outro lado da moeda
Um dos pontos fracos de “A Matriarca“, contudo, ocorre na atuação de algumas cenas, que não é muito convincente. Jamais de Charlotte Rampling, no entanto, que está aqui em uma das melhores performances de sua carreira.
Também é impossível não sentir que o roteiro poderia ter abordado mais certos temas, como a juventude de Ruth (Charlotte Rampling), nem que fosse com flashbacks. Ou mesmo o relacionamento dos pais de Sam (George Ferrier) e como suas interações influenciavam o jovem. Isso ajudaria o espectador a compreender ainda mais profundamente as dinâmicas familiares e traumas escondidos por trás delas, aumentando a imersão do público na narrativa, que é o que o longa tenta desenvolver.
No fim das contas, o que prende a atenção do espectador é a emoção. O sentimento. A mensagem transmitida mais pelo olhar do que pelas falas. É a atmosfera das cenas solenes, e o significado de supostas improvisações. É a poesia e o extraordinário que pode ser encontrado em algo, visto de fora, como cotidiano. O zoom aproximado na realidade de alguns e como algo que é um evento canônico na vida destes é apenas mais um nascer do sol na vida de outros.

“A Matriarca”
(Nova Zelândia, 2023, 95 min). Direção: Matthew Saville. Drama. Em exibição nos cinemas de todo o Brasil, à partir de 28 de março.