Em entrevista durante o Festival de Cinema Francês do Brasil, Bastien Bouillon comenta seu processo de atuação em “Mãos à Obra” (A pied d’Oeuvre’) e “O Segredo da Chef” (Partiu un jour’), reflete sobre o peso das escolhas pessoais na carreira e fala sobre o reconhecimento que chegou após anos de construção no cinema francês.
Em cartaz no evento com dois filmes centrais de sua carreira recente, “O Segredo da Chef” (Partiu un jour’), longa de abertura do Festival de Cannes 2025 dirigido por Amélie Bonnin, e “Mãos à Obra”(A pied d’Oeuvre’), de Valérie Donzelli, vencedor do prêmio de Melhor Roteiro no Festival de Veneza 2025, Bastien Bouillon se firma como um dos nomes mais consistentes do cinema francês contemporâneo.
Em “O Segredo da Chef”, Bouillon contracena com Juliette Armanet em uma história sensível sobre retornos, afetos e reconexões pessoais. Já em “Mãos à Obra”, ele vive um personagem que abandona a estabilidade para se dedicar à escrita, enfrentando a precarização, a invisibilidade social e os dilemas entre criação e sobrevivência. Em entrevista, o ator fala sobre sua abordagem de atuação, o peso do reconhecimento após o César, e os conselhos que daria a quem tenta seguir uma vocação artística em um cenário instável.
Em “Mãos à Obra”, sentimos um estilo de atuação mais silencioso e expressivo, algo presente em outros trabalhos seus. Como você desenvolve essa abordagem de carregar grande parte da história pelo olhar e pela expressão corporal?
Bastien – Essa escolha vem muito do roteiro da Valérie, porque o personagem é alguém que vai se apagando socialmente, inclusive em relação ao próprio status. Ele tenta viver de uma forma mais fiel a si mesmo nessa transição de fotógrafo para escritor. Por isso, não fazia sentido uma atuação muito eloquente ou performática. Para que a interpretação fosse justa, ela precisava estar próxima da essência discreta desse personagem, quase invisível. Ao longo do filme, ele passa também a observar mais a invisibilidade dos outros, dessas pessoas que normalmente não são vistas, como quem não tem documentos ou os imigrantes. É uma abordagem mais humilde, porque o escritor é alguém que escuta mais, observa mais e, muitas vezes, se expressa pelo silêncio.
O filme fala muito sobre “a chave do sucesso” e sobre seguir a própria paixão. Você já se viu preso nesse dilema ou a carreira de ator sempre foi algo muito centrado para você?
Bastien – Não foi exatamente o mesmo dilema, mas, no início da carreira, quando surgiram os primeiros trabalhos como ator, eu precisei fazer outras atividades paralelas para ganhar dinheiro e sobreviver. Além disso, me tornei pai muito jovem, o que trouxe ainda mais responsabilidades. Nesse sentido, existe uma aproximação com o personagem, principalmente por não ter abandonado a paixão. Assim como ele, que continua insistindo na escrita mesmo ficando mais pobre, eu também insisti na carreira de ator, apesar das dificuldades.

Em 2023 você ganhou o César de Melhor Ator Revelação por La Nuit du 12 (A Noite do Dia 12, em português). Isso trouxe mais pressão ou funcionou como uma confirmação de que você estava no caminho certo?
Bastien – Muitas pessoas recebem o César logo no primeiro filme, ou até mesmo sem nunca terem atuado antes. No meu caso, foi diferente, porque esse reconhecimento veio após quinze anos de carreira. Por isso, consegui saborear essa vitória de forma muito consciente, como um reconhecimento construído aos poucos, fruto do trabalho. Talvez antes eu ainda não estivesse maduro o suficiente para receber esse prêmio. Sem dúvida, ele abriu muitas portas e trouxe novas oportunidades, inclusive o convite para um filme de um diretor chamado Dominik, cujo roteirista também colaborou em projetos com a Valérie. Curiosamente, os dois personagens mais importantes da minha trajetória foram coescritos por esse mesmo roteirista.
Que conselho você daria para jovens do audiovisual que, assim como o protagonista do filme, vivem o conflito entre seguir o que amam e o que é mais rentável?
Bastien – O principal conselho é não fazer nada pensando nos outros, nem na família, nem na sociedade, nem na pressão do sucesso social. O mais importante é tentar buscar aquilo que te faz feliz, o que te dá prazer. O dinheiro também pode ser um objetivo, e isso não deve ser julgado, há pessoas que desejam isso. Mas, se a arte é essencial para você, é preciso fazer e se agarrar à sua vocação com todas as forças. Eu até lembrei da frase que disse ao receber o César de Melhor Ator Revelação, quando fiz um trocadilho dizendo: “Um César por ter mantido a esperança”. É uma profissão que exige renovação constante, transformação contínua e a busca permanente por novas oportunidades. É difícil, mas também profundamente emocionante.
A entrevista com Bouillon acontece em um momento especial de sua trajetória e ganha ainda mais peso por fazer parte da programação do Festival de Cinema Francês do Brasil, que trouxe ao país nomes centrais do cinema francês contemporâneo. Entre conversas sobre carreira, escolhas e processos, a passagem do ator pelo evento reforça a troca direta com o público brasileiro e o espaço do festival como ponto de encontro entre filmes, artistas e espectadores, celebrando um cinema que circula e se transforma. Confira todas as outras entrevistas disponíveis em nosso site.