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“O Livro da Discórdia” mostra lado cômico das relações familiares

Analisamos o longa “O Livro da Discórdia” e entrevistamos Baya Kasmi, diretora e roteirista da película, para saber mais a respeito do seu processo criativo.

Figurinha conhecida no mundo das comédias francesas, a atriz, diretora, e roteirista Baya Kasmi acaba de lançar no Brasil seu mais novo filme “O Livro da Discórdia“. O longa chega aos cinemas brasileiros pela edição 2023 do Festival Varilux de Cinema Francês.

O filme conta a história de Youssef Salem, um escritor que resolve se aventurar pelo mundo da ficção e escrever seu primeiro romance. O texto é parcialmente autobiográfico, e inspirado em sua juventude, em particular, nos tabus que rodeiam a sexualidade no ambiente onde cresceu. O livro ganha mais notoriedade do que ele esperava, causando uma certa tensão familiar, onde ele tentará manter a paz entre todos.

Baya já assinou o roteiro de filmes conhecidos como “Luta de Classes” (2018), além de dirigir “À Sua Completa Disposição” (2015); em “O Livro da Discórdia“, ela dirige e assina o roteiro junto com seu colaborador de longa data, Michel Lecrerc.

Entrevista com Baya Kasmi1

Em entrevista exclusiva, Baya nos conta que entende a dificuldade de Youssef porque ela também cria conteúdos autobiográficos. Ela queria fazer um filme que criticasse um pouco “essa exigência da sociedade em saber o que é verdade e o que é falso“. A diretora pretendia mostrar o que é justo, sem necessariamente ser o real:

Quando você cria algo, pega elementos do real mas cria uma ficção“. Comenta Baya e completa – “Agora, eu agora estou tomando um pouco de cuidado para não me expôr muito, nem expôr as pessoas“.

Esbanjando simpatia, Kasmi explica que para ela é interessante pensar que apesar dos acontecimentos serem os mesmos para todo mundo, cada um vai vivê-los à sua maneira, e que a verdade de um não será a mesma dos outros. “É tudo subjetivo“.

Sobre a gravação da cena em que Youssef tem a árdua missão de contar a seus pais que “Choque Tóxico” é um grande sucesso literário, Baya conta que foi muito engraçado de filmar: “Os atores já conheciam esse tipo de situação, porque já tinham vivido isso na vida pessoal deles. Estavam ansiosos para representar isso no filme“.

Baya Kasmi | Foto: Divulgação

Ela já conhecia a maioria dos atores, mas foi lendo o roteiro e descobrindo a fundo sobre o quê o filme se tratava, que todos se surpreenderam com a veracidade da narrativa, dizendo coisas do tipo “nossa, é bem assim mesmo que acontece“. Baya compartilhou ainda que: “ser um ator de origem argelina na França é representar uma minoria, então se tem uma pressão daquilo que pode ou não ser dito ou representado“. Ela também revelou que foi interessante poder brincar com o conceito de “segredos de família” e a ideia que “todo mundo sabe, mas a gente não fala sobre isso“.

Bastidores

A diretora aproveitou ainda para comentar com a Capy que sua cena preferida do longa é aquela em que os irmãos de Youssef precisam confrontá-lo sobre seu livro mas sussurrando, para não despertar a atenção dos pais. Ela conta que a cena fluiu muito naturalmente e que filmaram tudo em menos de uma hora, com apenas dois takes.

A Capy, por sua vez, recomendou alguns filmes brasileiros para a diretora, dentre eles, “Medida Provisória” (2022), com Lázaro Ramos. Ela anotou o nome e prometeu assistir, comentando ter visto e amado “Que Horas Ela Volta?” (2015), de Regina Casé, que foi um grande sucesso na França.

Análise

O Livro da Discórdia” começa num ritmo de livro, com flashbacks narrados e alguns trechos digitados por uma máquina de escrever. Essa ambientação inicial é tão interessante que, após 10 minutos dela, a sensação que fica é a de que essa configuração poderia ter permanecido até o final. Um recurso que filmes como “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain” (2001) e, mais recentemente, “Amor À Primeira Vista” (2023) utilizaram com sucesso.

O longa é leve e divertido desde o primeiro segundo. A premissa é simples mas interessante; é impossível não torcer pela discórdia já que Caroline Guiela Nguyen como Loubna, Oussama Kheddam interpretando Moustapha, e a brilhante Melha Bedia como Bouchra, os irmãos de Youssef (Ramzy Bedia), protagonizam as cenas mais hilárias do filme. Quando os três confrontam seu irmão escritor sobre “Choque Tóxico“, o infame livro que conta parte de suas vidas, é risada garantida ao espectador do início ao fim.

O Livro da Discórdia” transmite bem aquilo a que se propõe: as dinâmicas familiares. Todo o caos e alegrias que coabitam nas relações familiares, pessoas muito diferentes que se amam por repartirem os principais momentos de suas vidas. Youssef e Bouchra “brigam” no carro e do nada… se despedem de forma afetuosa quando ela o deixa em uma estação de trem; o tipo de coisa que acontece em toda família. E falando nela, Bouchra é uma das personagens mais bem desenvolvidas no longa, sendo uma pena que não apareça com mais frequência.

Críticas sociais

O filme também aborda de forma muito inteligente a cultura árabe e suas divisões: o que iranianos, argelinos, e demais possuem em comum, bem como suas características independentes. Ele também propõe uma conversa interessante sobre o quê ou quem determina quais etnias são “árabe o suficiente”, bem como debate diversas outras questões, como “se eu possuo um tipo de identidade cultural, isso me dá carta branca para falar sobre quaisquer temas dentro desse grupo? É repetitivo falar apenas sobre minhas experiências de vida? Preciso diversificar em meu trabalho para ser considerado bom no que faço?”

O longa também inova ao mostrar um homem (o protagonista) em situações geralmente enfrentadas por mulheres. Tais como ter suas opiniões invalidadas, beirando uma espécie de gaslight. Além de ser assediado por alguém em posição de poder, mesmo após o personagem recusar seus avanços diversas vezes.

Algumas críticas sociais sobre a cultura argelina em específico também são feitas, mas de forma mais discreta, sempre mesclando comédia com reverência. Muitas das músicas do longa possuem elementos da música árabe, como o idioma, a forma do canto, ou algum instrumento específico. Elas tendem a ser mescladas com batidas eletrônicas e ocidentalizadas, o que implicitamente ajuda a reforçar a situação de conflito que Youssef se encontra no longa, por pertencer a duas culturas distintas.

Foto: Divulgação
Conclusões finais

Youssef está sempre tomando nota de tudo, o que é uma característica que todo escritor pode se identificar. Apesar desse detalhe, outros aspectos de seu comportamento dificultam uma possível identificação com o personagem. Como, por exemplo, ele parecer insatisfeito durante todo o filme por causa de seu sucesso. No início do filme, ele parece querer ao menos um pouco de reconhecimento para “dar orgulho” a seu pai. Assim, a mudança em suas ambições parece muito brusca.

Apesar de suas razões para recusar a popularidade ficarem claras, não é muito realista alguém parecer tão incomodado pelos frutos positivos de seu trabalho. O roteiro também possui outras falhas, como dizer que um livro repleto de erros ortográficos:

  1. Não foi corrigido pela editora (que não os percebeu);
  2. Mesmo assim ganhou o prêmio literário mais concorrido e cobiçado da França, o Goncourt.

Outros fatores e decisões do personagem também ficam mal explicados, passando uma sensação de pressa para terminar logo o filme. Apesar disso, “O Livro da Discórdia” prende a atenção até o último minuto, misturando muito bem comédia com algumas pitadas de drama. É impossível não identificar algumas semelhanças com a cultura brasileira nele, o que lhe confere um charme ainda maior.

14º Festival Varilux de Cinema Francês

O Livro da Discórdia” é um dos 19 filmes inéditos participantes do 14º Festival Varilux de Cinema Francês. Ele fica disponível em cinemas de todo o Brasil até 22/11. A Capy cobriu a noite de estreia do evento, disponível aqui no site e em nosso Instagram e TikTok.

Além disso, entrevistamos Emmanuelle Boudier (curadora do festival) e Julia de Nunez (estrela da série de sucesso “Brigitte Bardot”).

Disponibilizamos também resenhas de outros longas participantes do evento. como: “Meu Novo Brinquedo“, “Maestro(s)“, “O Desafio de Marguerite“, “Making Of“, “O Astronauta” e “O Renascimento“.

“O Livro da Discórdia”

(França, 2023, 97 min.). Direção: Baya Kasmi. Comédia. Em exibição nos cinemas pelo Festival Varilux de Cinema Francês 2023.

  1. Nosso agradecimento especial a Jens Munck, o grande tradutor e intérprete que possibilitou nosso papo com Baya Kasmi durante o junket do Festival Varilux de Cinema Francês. ↩︎

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