As duas vitórias recentes de Mendonça Filho e equipe evidenciam o poder do cinema brasileiro no cenário internacional
“O Agente Secreto” segue como tema de reflexão para quem valoriza o cinema autoral e político. Sob a direção de Kleber Mendonça Filho, o longa recebeu, recentemente, dois prêmios de peso: o FIPRESCI, da Federação Internacional de Críticos de Cinema, e o “Art et Essai”, concedido pelos exibidores independentes franceses da AFCAE (Associação Francesa de Cinema d’Art et d’Essai). Os reconhecimentos consolidam o longa como um trabalho que transcende o entretenimento, tratando de memória e identidade de um Brasil ainda em processo de digestão de seu passado.

Narrativa que emociona e provoca
A repercussão do filme não se limita aos troféus. Segundo o próprio Mendonça Filho, o impacto emocional de “O Agente Secreto” foi visível nos encontros que teve com jornalistas em Cannes. “Eu conversei muito com a imprensa, estive com jornalistas no domingo, na segunda, na terça e um pouco quarta. Nesses dias, eu contei sete vezes que aconteceu das pessoas, ao falarem do filme e tentar me fazer uma pergunta, ficarem com a voz embargada e pararem de falar, porque alguma coisa tinha ativado algo muito forte nelas. Isso aconteceu com jornalistas brasileiros e de nacionalidades diferentes, como franceses, espanhóis e italianos. E eu acho isso muito significativo. Eu acho que é um filme que fala do passado, fala do presente, fala do futuro”, relatou o diretor.
Para o júri da FIPRESCI, “O Agente Secreto“ representa um mergulho poético e histórico. Eles destacaram: “Escolhemos um filme que tem uma generosidade romanística e épica; um filme que permite digressão, diversão, humor e caráter para evocar um tempo e lugar e uma história rica, estranha e profundamente preocupante de corrupção e opressão. Um filme que faz suas próprias regras, que é pessoal, mas universal, que leva seu tempo e mergulha você em um mundo – o mundo do Brasil governado pelos militares em 1977 e o mundo das pessoas boas em tempos ruins.”
Thriller político cheio de ecos do passado
O enredo do filme revisita o Brasil de 1977, ainda mergulhado na ditadura militar. Wagner Moura vive Marcelo, um especialista em tecnologia que carrega segredos do passado e tenta reconstruir sua vida em Recife. Contudo, logo descobre que a cidade não oferece o refúgio que imaginava, mas sim novos desafios que ecoam as sombras da repressão. O elenco conta também com Maria Fernanda Cândido, Gabriel Leone, Carlos Francisco, Hermila Guedes, Alice Carvalho e Roberto Diogenes, ampliando o impacto dramático dessa história.
Coprodução internacional e distribuição ampla
A produção de “O Agente Secreto“ carrega o selo de Emilie Lesclaux e integra uma rede de colaboração internacional que envolve a CinemaScópio (Brasil), MK Productions (França), Lemming Film (Holanda) e One Two Films (Alemanha). A distribuição no Brasil fica por conta da Vitrine Filmes, enquanto no mercado internacional o longa chegará ao público pelas mãos da NEON (nos EUA e Canadá) e da MUBI (no Reino Unido, Irlanda, Índia e América Latina, exceto Brasil).
Consistência de Mendonça Filho em Cannes
Os prêmios recentes evidenciam ainda mais o vínculo de Kleber Mendonça Filho com Cannes. Essa já é a quinta participação do cineasta no festival. Em 2019, ele dividiu com Juliano Dornelles o Prêmio do Júri por “Bacurau“. Antes disso, Mendonça Filho já havia levado suas produções “O Som ao Redor“, “Aquarius” e “Retratos Fantasmas” para a Croisette. Assim, sua presença foi consagrada como um dos nomes mais relevantes do cinema brasileiro contemporâneo. Seus filmes não só conquistaram espaço no circuito internacional como também cativaram um público fiel nos cinemas do Brasil.
Dessa forma, mesmo passado o frisson da cobertura quente de Cannes, “O Agente Secreto“ segue inspirando debates sobre as feridas do Brasil e sobre como a arte pode, ao mesmo tempo, expor e curar essas memórias. Afinal, como bem apontou Mendonça Filho, esse é um filme que fala de ontem, de hoje e de amanhã, que se mantém pulsando.